Esta é a pergunta de partida das pesquisas científicas da psicóloga estadunidense Becca Levy. A visão do envelhecimento tem a ver com a maneira como envelhecemos, esta é a conclusão de décadas de pesquisas sobre o envelhecimento, realizadas em muitos locais e países.
Entre as diversas pesquisas, cito abaixo um estudo de longo período com um mesmo grupo, em que a autora constatou, “que os participantes com uma visão positiva da idade mostraram uma saúde funcional muito melhor ao longo de dezoito anos que os da mesma idade com uma visão negativa. Foi a primeira vez que alguém demonstrou que a forma de ver a própria idade — em vez do “envelhecimento” — era um fator importante no desempenho físico na velhice. Levy, 2022”.
A visão do envelhecimento é construída na formação do sujeito e pode ser modificada ao longo da vida pelo conhecimento e conscientização de que não há verdade absoluta sobre o envelhecimento. O meio em que se vive, a Educação e a Saúde incutem visões sobre o envelhecimento, para além das ciências. Há uma normalidade social na formação dos costumes, que formam estereótipos. E essa normalidade é carregada de preconceitos e moralismos, como ocorre também na misogenia e na homofobia. São costumes carregados de discriminação social. O etarismo é uma maneira de segregação das pessoas mais velhas, tanto no trabalho como na socialização e na família.
Ao analisar como se formam as subjetividades sobre o envelhecer, lembremos que a construção do indivíduo se dá de maneira inconsciente, pois cada um nasce em um tempo-espaço dinâmico em que os costumes e as crenças são incutidos no processo de vida desde o nascimento. Ao se dar conta de si, a pessoa carrega um modo de ver o mundo. Assim, a visão sobre o envelhecer compõe os modos de subjetivação do meio em que se vive. “O território de subjetividades das relações humanas e do sofrimento pessoal, não material, é definido pela moral, bons costumes, cultura dominante e o poder dos profissionais de saúde, de posse do saber científico (LAING, 1975).
Nem todos os países têm leis para garantir os direitos, como o Estatuto da Pessoa Idosa (Lei 10.741/2003; Lei 14.423/2022) no Brasil. Mas não basta a lei, se o que ela determina não for desenvolvido em um país, por meio de políticas públicas para garantia de direitos. Ainda, a mudança nos modos de pensar e agir precisa fazer parte da formação em Educação, Saúde, Ciências Humanas e Sociais (enfatizo estas, mas deveria fazer parte de qualquer formação profissional). Os profissionais de saúde e educação corroboram em grande parte com o lugar comum, quando no exercício profissional é esperada a postura baseada em conhecimentos e métodos compatíveis com os direitos das pessoas.
Povos e nações diversos constroem visões diferentes sobre o envelhecimento e, consequentemente, a maioria dos habitantes de um local tem uma visão parecida. A visão e as atitudes com a pessoa idosa vão a extremos, desde a valorização da sabedoria dos mais velhos até o tratamento como se fossem um estorvo social. Há Línguas que nem sequer têm uma palavra para designar a estigmatização do velho. No Brasil, etarismo, palavra ainda pouco conhecida, é usada para mostrar a discriminação das pessoas idosas.
A palavra etarismo deriva da palavra inglesa ageism, criada em 1969 pelo médico e gerontologista Robert Neil Butler. O sufixo “ismo”, de origem grega, forma palavras que indicam conceitos gerais. Assim, etarismo é uma forma de discriminação baseada na faixa etária, que se manifesta por meio de estereótipos relacionados à idade.
O etarismo é um preconceito que pode contribuir para a segregação da população e está ligado a padrões sociais como a valorização da juventude e da produtividade. O etarismo é enquadrado como crime no Estatuto da Pessoa Idosa (Lei nº 10.741/2003).
Definição criada por IA do Google
A convivência respeitosa entre gerações, como entre avós e netos, o modo como os pais e professores veem os mais velhos, a maneira como o médico trata pacientes idosos, tudo isso influencia as mentes para o olhar para a pessoa idosa. São as subjetividades que definem os modos de convivência. Desde o século XX, com a extrema valorização das ciências e até das pseudociências, a área de Saúde determina em grande parte como se deve envelhecer.
Os mais poderosos definem modos de vida aos assujeitados, rotulam a pessoa idosa e como se processa o envelhecimento. Resumidamente, a visão dominante da idade como um declínio físico e mental inevitável, leva mais e mais pessoas a acreditarem nos processos degenerativos e não conseguirem sair desta determinação física e social para idosos. Nos locais ao redor do mundo, em que envelhecer é enaltecido, como uma conquista, com respeito à experiência e ao conhecimento de quem vive mais, as pessoas idosas sofrem menos e têm melhor saúde mental e física, aumentando a média de vida em relação aos países segregacionistas, mostram pesquisas científicas.
No Brasil, convivem diferentes visões do envelhecimento, por exemplo, entre os povos originários e outras populações com reduzido convívio com o meio urbano, a idade é considerada sabedoria. O meio rural vive grandes transformações e, portanto, também mudança de costumes, influenciada em grande parte pelos meios de comunicação. Nas grandes cidades, o mundo do trabalho exclui os mais velhos, por exemplo. A partir do Estatuto da Pessoa Idosa, ampliaram-se os grupos de convivência e alguns direitos foram aplicados por lei, como gratuidade em transporte público, prioridade em filas, sendo os mais conhecidos.
Por tudo que foi brevemente colocado, é possível entender que mudanças sociais se dão por meio de várias perspectivas. Quero, no entanto, lembrar que “como o cérebro plástico sempre pode permitir a separação de funções cerebrais que foram criadas juntas, sempre é possível haver uma regressão ao barbarismo: a civilização sempre será uma questão delicada, que deve ser ensinada a cada geração e sempre alcança, no máximo, uma geração (Doidge, 2007). Por outro lado, se é possível decair em uma geração, também é possível mudar as mentalidades sobre a pessoa idosa em uma ou duas gerações. Isto traria benefício a cada um, pois a visão sobre o envelhecimento fará sua parte no modo de cada um envelhecer.
Referências